Uma conversa honesta sobre eletrônicos e crianças
Eu realmente não queria falar sobre este assunto aqui no blog simplesmente porque eu entendo a tua luta. Eu sou uma “simples” mãe como você, que corre de um lado pro outro tentando conciliar todas as necessidades ao meu redor e conseguir respirar no fim do dia. Eu sou a mãe que tive que ir na consulta pós – parto de 40 dias com um bebê recém-nascido, um de 2 anos e outro de 4, sem o maridão que infelizmente naquele dia não podia faltar trabalho de jeito nenhum. E enquanto eu amamentava o pequeno e tentava escutar o médico, os outros 2 assistiam um desenho no celular. E eu me sentia super envergonhada, pensando que o médico, calmo, educadíssimo e culto, ia me achar a pior mãe do mundo. Eu também sou a mãe que você viu no restaurante, aquela que acabou dando o celular pro pequeno se distrair porque estava morrendo de vergonha dele ficar chorando e reclamando pra sair da cadeirinha e atrapalhando o almoço de todos que estavam no restaurante. Também sou aquela mãe que de vez em quando coloca o desenho do Macaco George pra poder terminar a janta ou postar um texto aqui no blog.
Por isso eu sei, querida mãe, eu sei que toda vez que alguém vem falar sobre educação perfeita, sem galinha pintadinha, sem ipad, sem batata frita nem suco de caixinha, você sente aquele arrepio na espinha porque ninguém sabe a loucura e delícia que é ser mãe dos teus filhos além de você. Também sei que dá até um pouquinho de raiva ouvir a Gisele Bündchen falando que os filhos dela nunca assistiram TV. Bem, com empregada, babá e milhões de dólares na carteira, até eu, não é assim que você pensa?
Então por favor me entenda, querida mamãe. Eu demorei muito tempo pra falar sobre este assunto porque eu realmente não quero colocar mais um peso nas tuas costas nem te fazer sentir culpada. Eu realmente não te julgo quando vejo teu filho no celular quando você está no mercado nem quando teu filho convida os meus pra jogar video game na sua casa (e permita-me dizer que meus meninos adoram este tipo de convite).
Mas eu acho que precisamos abrir nossa coração pra uma conversa franca sobre estas coisas, porque eu realmente me preocupo um pouco com a quantidade de tempo que nossos filhos tem gastado com a tecnologia e o efeito dela na infância deles.
Será que estamos anestesiando nossos filhos com as melhores das intenções? Você já passou por uma anestesia, seja ela local ou geral? A anestesia é o processo pelo qual um médico usa um medicamento para que o paciente não sinta nada, o paciente está amortecido ao que está acontecendo ao redor dele. A palavra anestesia vem do grego e significa ausencia de sensação. Um médico anestesia uma pessoa pra que ela não perceba o que está acontecendo com ela durante um procedimento, por exemplo. E o que tem a ver anestesia com a tecnologia e nossos filhos?
O que fazemos com eles cada vez que suprimos suas necessidades com um entretenimento, seja um ipad ou um joguinho? Estamos anestesiando nossos filhos para os reais sentimentos, as reais sensações deles. O bebê chora porque está com sono e precisa dormir, mas ao invés de dormir, o anestesiamos na frente do ipad. O bebê chora porque está cansado de ficar na cadeirinha do restaurante por tantas horas, ele tem necessidade de andar, brincar, então o distraímos (anestesiamos) com um celular. Nossos filhos querem atenção, querem brincar, interagir, mas estamos muito ocupadas ou cansadas e então os distraímos (anestesiamos) com horas na frente da televisão. E qual o problema disso? O problema é que parte fundamental do amadurecimento de uma criança é aprender a lidar com seus sentimentos, suas emoções. É saber lidar com a frustração, é saber observar em si mesmo o que está errado, o que está lhe incomodando, é comunicar seus sentimentos e se expressar (Dr Gordon Neufeld). Quando anestesiamos nossos filhos estamos impedindo que eles aprendam a lidar com seus sentimentos e estamos os incentivando a buscar um escape sempre que se sentirem incomodados em vez de lidar com aquela situação. Os condicinamos a buscar alívio nas redes sociais, no excesso de estímulo e informação. Também os impedimos de explorar o mundo à sua volta, pois que criança vai brincar com suas próprias mãos ou fazer um novo amiguinho quando está vidrado na telinha?
E assim se forma um caminho perigoso, o caminho do vício, que está ligado a satisfazer os desejos da alma com algo que nos traga alívio temporário para as frustrações. Aqui nos EUA, por exemplo, tem um show na tv de pessoas extremamente obesas que perderam totalmente a mobilidade e estão com sérios problemas de saúde porque encontraram na comida um refúgio para as dores da alma. Essas pessoas tem dificuldade de lidar com ansiedade, tristezas e comem para se sentir melhor. A comida torna-se o cano de escape assim como drogas para outros, bebidas, internet, jogos e horas e horas na frente do computador. Infelizmente, nos últimos anos, acompanhei algumas histórias de casamentos que acabaram por causa do vício do marido no computador. O vício era tão grande que eles eram totalmente indiferentes às necessidades emocionais da esposa e dos filhos, e nem mesmo o divórcio mudou isto. Um deles, por exemplo, quando a esposa disse que já não aguentava mais, não pediu outra chance ou ajuda para mudar. Seu único pedido foi que ele pudesse levar o computador com ele.
E mesmo na vida de crianças, observo que quando existe exagero na quantidade de horas gastas com tecnologia, tudo o mais perde o interesse. O excesso de estímulos visuais e auditivos faz todo o resto parecer chato. Esses dias fui na biblioteca com meus filhos pra uma atividade especial que eles tem com músicas, histórias e dança. Algo super divertido e atrativo. Vi um menininho de uns 2, no máximo 3 anos que estava com a avó. Ele choramingava o tempo todo interrompendo a classe e percebi que ele tentava colocar a mão dentro da bolsa da avó. Imaginei que ele estava com fome, queria uma bolachinha ou talvez uma chupeta, até que a vó, obviamente frustrada, retirou o ipad de dentro da bolsa e disse: “Ok, vamos embora, estamos atrapalhando todo mundo, mas é a última vez que te dou esse ipad, vou ter que conversar com sua mãe”. Situações como estas me fazem avaliar se não precisamos meditar um pouco sobre o papel da tecnologia na vida das crianças.
Como resolver o problema?
Como disse no começo, sei que não é fácil viver uma vida sem estes recursos e creio que na maioria dos casos não precisamos radicalizar, mas precisamos sim encontrar um equilíbrio melhor de como e quanto usamos estes recursos. Algumas sugestões que posso dar:
Reavaliar nosso estilo de vida: Se temos filhos pequenos, estamos numa nova fase, uma nova estação da nossa vida e algumas prioridades precisam ser reavaliadas e colocadas em ordem pra que possamos suprir as necessidades dos nossos filhos e encontrar uma rotina e um ritmo agradável tanto para eles quanto para nós. As vezes, é necessário dizer não para algumas coisas a fim de atendermos as necessidades dos nossos filhos. Minha vida melhorou muito quando admiti pra mim mesma que eu não era uma super mulher nem capa de revista Marie Claire, ou a mulher perfeita, que concilia todas as áreas da vida com perfeição. Aceitar minhas limitações fez com que eu diminuisse o ritmo e aliviasse bastante o estresse aqui em casa. Passei a ter mais tempo pros meus filhos e menos necessidade de estar levando-os de um lado para o outro, o tempo todo cansados e forçados a acompanhar um ritmo que não era adequado para eles. Dentro do possível, respeito o horário deles dormirem e os limites e o ritmo de uma criança, que são diferentes dos nossos. Claro que existe espaço pra flexibilidade e criatividade, mas a partir do momento que o passeio, o compromisso ou o que for vira um sofrimento pra mim e pra eles, é hora de reavaliar.
Mudança de hobbies e atividades: Eu e meu marido amávamos passar horas e horas nos lindos cafés que estão localizados nas áreas históricas da cidade, conversando com amigos. Mas a verdade é que o que era um prazer para nós era uma tortura para nosso filhos de 2, 3 anos de idade. Nessa idade, eles simplesmente não gostam de ficar horas sentados numa cadeira ouvindo conversa de adulto e vão deixar isto bem claro, reclamando e chorando. Procuramos outras atividades que sejam prazerosas para ambos os lados. Vamos andar de bicicleta, fazer hiking pra achar uma cachoeira e praticar esportes. Todas estas atividades também trazem prazer pra nós como casal mas incluem nossos filhos. Eles não precisam ficar sentados horas ali no celular enquanto só nós nos divertimos.
Mundo virtual por mundo real: a verdade é que muitas vezes eu mesma estou precisando conversar, me relacionar com outras pessoas e vou pro face ou instagram e meus filhos vão pra televisão ou joguinho. Mas nestes momentos de solidão, de vontade de sair de casa e conversar, se em vez de corrermos pro computador ligássemos pra uma amiga que provavelmente também está se sentindo sozinha e marcássemos de ir numa pracinha para as crianças brincarem? Enquanto suprimos nossa necessidade de bater papo e ter uma conversa com um adulto, alguém que não vai falar sobre piratas, dinossauros e trens, nossos filhos podem correr e brincar juntos e experimentar a alegria de ter amigos. E faço um parênteses aqui pra dizer que ter amigos que estão vivendo esta mesma fase da vida que a gente é tudo de bom!
É uma estação: é corrido, alguns dias e semanas são difíceis mesmo, mas esta é uma estação linda e preciosa que estamos vivendo. Se for necessário, deixe o perfeccionismo de lado, deixe a casa um pouquinho menos arrumada, faça uma janta mais simples, mas tenha tempo pra desfrutar dos seus filhos. Não deixe o peso ficar tão grande que o maior motivo de júbilo e alegria, que é o milagre da vida, torne-se um fardo pesado demais.
Crianças não são problema: já ouviu a frase: “nossa, que gracinha seus filhos, nem parece que tem criança aqui”? Claro que gosto quando meus filhos estão de bom humor e tudo vai bem, mas nem todos os dias são assim.
Vivemos numa sociedade que não tem a mínima paciência com os mais “fracos”. Basta uma crianças resmungar numa igreja ou num shopping que todo mundo abre o olhão e fica te olhando. Mas crianças são crianças e vão sim chorar de vez em quando, derrubar coisas, fazer birra e “atrapalhar” a vida dos adultos. Embora eu ensine meus filhos a serem respeitosos e educados, não vou sufocá-los para que eles atendam a expectativa dos outros: estejam sempre de bom humor, sempre felizes e sorridentes, sem interromper a ocupada e “perfeita” vida adulta. Se eles chorarem, vou ver o que aconteceu, conversar e tentar acalmá-los. Pode levar alguns minutos mas me recuso a simplesmente enfiar um computador da frente deles para que eles não me atrapalhem.
Eu sei que mesmo revendo prioridades, mudando nossa rotina, focando nas coisa boas ao invés das ruins, tem dias que nada vai dar certo. Tem dias que um vai estar doente e que os outros vão passar o dia na frente da televisão enquanto você tenta cuidar do dodói. Eu sei que o Ipad e o celular em alguns momentos são nossos melhores amigos e a babá mais econômica que podemos encontrar, e em várias ocasiões vamos precisar recorrer a eles. E está tudo bem com isso! Mas a verdade é que a infância dos nosso filhos é preciosa demais pra ser perdida atrás de um computador. Permita que seu filho experimente as diversas sensações: do vento gelado, da grama molhada de orvalho debaixo do pé. Permita que ele sinta o cheiro da flores ou do pão de queijo saindo do forno. Ouvir o barulho da chuva e das risadinhas de outra crianças. Pemita-o correr pelo quintal, permita-o sujar suas mãozinhas de tinta guache, permita-o plantar uma hortinha, permita-o experimentar. Melhor ainda, não só permita-o viver tudo isso, mas viva tudo isto com ele! E não vai demorar muito pra juntos descobrirmos que o mundo real ainda é muito melhor que o virtual!
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