O menininho que mudou meu coração.
Depois de encher uma sacola de suquinhos, frutas e lanchinhos, paro pra pegar meus filhos no ponto do ônibus escolar e dali, vamos conversando sobre o dia que tiveram enquanto nos dirigimos até o parque mais próximo para brincar e relaxar. Alguns minutos depois que chegamos lá, um lindo menino de pele morena que contrasta com seus dentes super brancos grita de longe: “Oi Joshua, oi Ian” e corre em nossa direção. Eu pergunto aos meus filhos de onde eles conhecem o menino e eles me dizem que é do ônibus escolar. O Jacob se aproxima e começamos a bater papo sobre a escola, o dia lindo e esportes, nada novo pra meninos de 7 anos. O calor é grande e chamo meus filhos pra tomar um suco e comer algo refrescante. Ofereço ao Jacob alguns lanchinhos e pergunto por sua mãe e ele me responde que veio ao parque a pé com um irmão mais velho, que ele não tem pai e sua mãe precisa trabalhar até de madrugada em um restaurante pra sustentar a família. Sinto um aperto no meu coração por aquele menino, chamo ele pra comer conosco e o vejo devorando os lanchinhos para quais tantas vezes meus filhos fazem cara feia. Minha vontade era abraçar aquele menino, percebendo qual carente ele é de atenção. Mas como não podia, fui brincar de tênis, basquete e correr com eles até cansar. Algumas horas depois, o irmão adolescente que estava em uma outra área do parque com os amigos, vem chamá-lo pra ir embora, mas por dias o Jacob não sai da minha cabeça.
Semanas se passam até que um dia vou almoçar com os meus filhos na escola. Em meio a perguntar como o dia tinha sido e ajudá-los a abrir o leite, vejo o Jacob atravessando o grande refeitório, acenando com a mão e dizendo “Hi Mrs. Tathiana, hi Mrs Tathiana”. (Oi Senhora Tathiana, oi). Eu só queria vir te dizer oi.” Jacob tinha o sorriso mais lindo no seu rosto ao correr ao meu encontro e o mais impressionante pra mim foi a forma como ele se lembrou e pronunciou meu nome perfeitamente. Tathiana não é um nome nem um pouco comum nos EUA e até amigos tem a maior dificuldade para lembrá-lo ou pronunciá-lo. Mas ali estava o Jacob, um menininho com o qual reparti um lanchinho e brinquei por algumas horinhas, com o sorriso mais lindo me chamando pelo nome. Sua professora o chamou e ele voltou pra junto de sua classe, mas desde este dia, todas vezes que vou almoçar com meus filhos, ele corre ao meu encontro pra dizer “Hi Mrs. Tathiana.”O Jacob não sabe, mas nossos curtos encontros tem mudado meu coração e as melhores palavras pra descrever o sentimento que tenho é “profunda compaixão.”
“ao ver as multidões, Jesus sentiu grande compaixão pelas pessoas, pois que estavam aflitas e desamparadas como ovelhas que não têm pastor.” Mateus 9:36
Anderson* é um vizinho nosso com uma situação familiar super complicada. Frequentemente ele quer brincar com meus filhos e passar tempo com nossa família. Um dia desses meu marido levou meus três filhos e o Anderson pra brincar na frente da casa enquanto eu fazia algumas coisa dentro. Passaram-se alguns minutos e ouço alguém batendo na porta fortemente e corro já imaginando que é algum dos meus filhos apurado pra ir no banheiro. Mas assim que abro a porta, o Anderson dispara como uma metralhadora: “hei, você não vai vir brincar com a gente também, vamos , vamos!” Eu pergunto a ele surpresa: “Ué, mas o Christian não está lá brincando e cuidando de vocês? Eu estou organizando algumas coisas aqui” E ele dá a resposta que me derrubou. “Sim, ele está, mas eu gosto tanto de ver todos vocês juntos”, referindo-se a nossa imperfeita família . Não me entenda mal, mas o Anderson não é um menino agradável de estar por perto. As vezes já até me questionei quanto contato ele deve ter com meus filhos. Mas naquele momento, tudo que lembrava era de: “ao ver as multidões, Jesus sentiu grande compaixão pelas pessoas, pois que estavam aflitas e desamparadas como ovelhas que não têm pastor.” Eu, tão imperfeita, as vezes até reclamando de alguns hábitos do pequeno vizinho que eu me incomodavam, sou surpreendida ao perceber que ele sente-se bem perto de nós. E mais uma vez meu coração enche-se de compaixão. Por ele, pela mãe que num mar de dificuldades e traumas está fazendo o que sabe pelo menino,e por toda a trágica situação que ele tem vivido.
Jordan é um menino magricelinho e muito miúdo que estuda na segunda-série junto com meu filho. Se não o conhecesse, jurava que ele era da classe do jardim de infância. Olhando pra sua aparência fica claro que ele não se encaixa no perfil da maioria das outras crianças da escola, meninos bem vestidos, com roupas bonitas e centenas de brinquedos na casa. Ele é tão raquítico que meu filho de 3 anos é maior do que ele. Todas as vezes que ia almoçar na escola ou participar de uma atividade, ficava observando o Jordan. Ele não tinha amigos, não prestava atenção na professora e não comia absolutamente nada de sua comida e tinha o olhar mais triste que já vi. Tudo que tinha na lancheira ia pro lixo sem sequer ele abrir os pacotinhos. Um dia, durante o almoço comecei a conversar com ele e insistir pra que ele experimentasse a comida . A professora de Educação Física que estava almoçando por perto me disse: Não se preocupe, ele nunca come nada da comida dele. Isso é normal” Jordan chega na escola as 7 da manhã e sai as 3 da tarde e passa todas estas horas na escola sem sequer tocar em sua comida.
Jesus, ao ver as multidões, teve compaixão! Ele olhava além da criança difícil, da mãe que sai pra trabalhar e deixa o filho o dia inteiro sozinho com o irmão “irresponsável” que vai ao parque sem sequer levar uma água, do menininho franzino que nenhuma criança quer brincar ou sentar perto na hora do recreio. Jesus tinha compaixão da multidão.
Cada vez que encontro com um Jordan, um Jacob ou um Anderson fico me perguntando o que nós, igreja, escolas, pais e mães temos feito por essas ovelhinhas. Ovelhinhas aflitas, perdidas, com dores na alma, perdidas sem um pastor? Onde está a nossa compaixão? Será que temos fechado o nosso ouvido para seus gritos pois tudo isso é muito complicado e nem sabemos por onde começar? Será que temos silenciado o grito da alma deles com diagnósticos e remédios as vezes desnecessários, video games e telefones ou simplesmente fechado nossos ouvidos pra realidades que existe uma geração inteira de crianças que está desorientada, perdida como ovelha sem pastor? O que fazer, como resolver? Honestamente não sei. Mas pra começar, podemos simplesmente nos identificar com o Mestre. Ame o menino difícil da sua vizinhança, ame a criança da classe que é deixada de fora, ame a mulher do seu prédio que se sente envergonhada por ser a única mãe solteira vivendo ali. Puxe conversa, esteja disponível, pague um lanche, envie um bilhetinho com palavras de encorajamento.
Simplesmente pare por alguns segundos e olhe para a “multidão”. No momento que paramos e olhamos, nosso coração se enche de grande compaixão.
“Ao ver as multidões, Jesus sentiu grande compaixão pelas pessoas, pois que estavam aflitas e desamparadas como ovelhas que não têm pastor.” Mateus 9:36
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